
Começava a anoitecer... Ela caminhava pela estrada de areia em direcção à praia. Era naqueles momentos de rara beleza ambiental, quando o sol beija o mar, que Margarida se aproximava do lugar onde vivera as maiores alegrias da sua vida. Junto ao farol, ela encontrava-se com o seu passado e recordava os melhores momentos da sua vida.
Ali, naquele lugar, onde o mar beijava a areia e o farol começava a iluminar com a sua luz os pequenos barcos que ao longe na linha do horizonte se avistava, que a mulher adulta vivia por momentos as suas recordações de moça apaixonada e sentia a brisa do mar lhe trazer o cheiro do único homem que amara.
E chorou. Não por aquilo que fez, mas por aquilo que não teve coragem para ser e viver. Pediu perdão, mas sabia que o tempo já não voltaria mais atrás. E sentindo remorsos pela felicidade que deixou fugir por entre os dedos das mãos, Margarida chamou o seu nome, pediu a sua ajuda, como se ele fosse capaz de aparecer do fundo do mar e devolver-lhe a juventude que por cobardia não foi capaz de viver.
E Ricardo era o seu nome... O nome pelo qual ela chamava sempre naquele lugar, na esperança de um dia ele regressar.
O seu choro ouvia-se baixinho... Afinal, ela não estava sozinha. Alguém se encontrava ali e naquele momento Margarida sentiu uma forte presença, um perfume que lhe era característico.
Olhando para trás, viu aproximar-se um vulto que vinha ao seu encontro.
Limpou as lágrimas. E tentou modificar a expressão do seu rosto de modo a parecer bem. Esse vulto agora tornava-se, com o seu aproximar, cada vez mais nítido. Margarida levantou-se com medo de que o homem que chegava pudesse lhe fazer algum mal.
- Não tenha medo! - disse o homem que aparentava uns 40 anos, não mais.
- Que quer?, perguntou Margarida com receio e a voz meio trémula.
- Apenas ouvi o seu choro e tomei a audácia de lhe vir oferecer a minha ajuda se necessitasse.
- Como pôde ter escutado o meu choro se eu própria mal o distinguia?
- Há coisas que não se ouvem com os ouvidos, mas sim com o coração.
Margarida já tivera ouvido aquela frase antes. Não lhe era desconhecida aquela voz e de repente sentia-se a voltar atrás no tempo.
- Margarida, não te lembras de mim? - perguntou com um meigo sorriso.
- És tu, Ricardo? - disse ela com as lágrimas novamente a lhe inundarem o rosto.
- Sou! Voltei! Nunca ouviste aquela frase de que voltamos sempre onde um dia fomos muito felizes? Eu voltei, sim! E voltei porque o tempo me fez ver o que realmente aconteceu. E voltei para recuperar tudo o que deixei fugir.
- Mas disseram-me que tinhas morrido, disse Margarida.
- E tu alguma vez acreditaste nisso?
- Não! Na verdade, o meu coração dizia que não tinhas morrido. Mas eu fui fraca, deixei o meu pai impor-se àquilo que nós sentiamos um pelo o outro e não fui capaz de ser forte e viver contigo tudo o que durante anos chorei amarguradamente.
Ricardo aproximou-se de Margarida, limpou-lhe o rosto com os lábios e sentindo a respiração que começara a tornar-se ofegante, os dois deram um beijo demorado.
E ali permaneceram... A lua cheia já iluminava o céu e o sol já tinha desaparecido no horizonte. Não tinha sido o mar que tinha trazido Ricardo de volta, mas a leve brisa fresca daquela tarde de fim de verão que unia novamente aqueles dois seres que o tempo tinha separado durante tantos anos.